31/01/2009



Um amigo me disse certa vez, entusiasmado, que um guitarrista de um famoso ministério de louvor havia declarado que antes sua inspiração musical vinha de músicos como Jimi Hendrix e Steve Vai, mas que isso estava errado, hoje ele entende que sua única inspiração é Jesus!!
- Que legal – pensei - não sabia que Jesus tocava guitarra.

Estou certo, como já disse, que nossa maior inspiração vem do Criador, e nosso poder criativo existe porque Ele nos criou a sua imagem e semelhança, é um dos atributos que nos difere dos animais irracionais junto a capacidade de raciocínio.

Porem não há como imaginar que os cristãos sejam detentores da verdade sobre todos os assuntos da vida, a confusão entre conhecer a Verdade, que é Cristo – e ainda assim conforme Lhe agradou fazer-se conhecido – e conhecer a verdade sobre todas as coisas é absurda.

Deveria ser obvio que conhecer a Cristo não faz de nós conhecedores sobre todos os assuntos sobre todas as áreas da vida.

Por exemplo, ao servir a Cristo você não passa a saber tudo sobre a teoria da relatividade, isso acontece porque você estuda, você também não se torna um médico por começar a servir a Jesus.

Aliás, creio que não tenha tanta gente confusa sobre isso quando a área é a medicina, é ponto comum – exceto aos totalmente alienados – que para ser médico é preciso estudar e se interessar sobre os assuntos da medicina.

Em se tratando de arte e comunicação não é diferente, é preciso estudar e ter interesse verdadeiro pela produção cultural e artística moderna e histórica.
O guitarrista gospel usou uma grande frase de efeito, mas o efeito não causa nenhum benefício, apreciar o trabalho de grandes guitarristas não o faz menos dependente ou servo de Cristo nem lhe lança no “mundo”.
C.S.Lewis foi capaz de produzir uma variedade incrível de escritos - tanto os ficcionais como os teológicos - porque era um leitor voraz, entre seus livros preferidos estavam “O Peregrino” de John Bunyan e “A Rainha Das Fadas” de Edmund Spencer, um cristão e um anti-cristao, lia ainda os evangelhos apócrifos porque se interessava pela narrativa criativa, mesmo essa não contendo verdade.
O prazer que Lewis tinha pela leitura formou o escritor que nos deixou obras como “As Crônicas de Narnia”, “O Problema do Sofrimento”, “Cristianismo Puro e Simples” e muitos outros livros.

Ele não parecia temer apreciar algo “secular” ou usava frases de efeito para reafirmar sua fé e vida de serviço a Cristo.

Esse temor em apreciar o “secular” não é sinal de maturidade espiritual, pelo contrário mostra apenas uma tendência em se deixar escravizar por dogmas humanos criados por pessoas legalistas, ou revela um temor em perder a fé ou ainda um condicionamento pelo marketing do grande mercado gospel.


É igualmente triste em todas as hipóteses, pois se na primeira ficamos a mercê da religiosidade castradora de homens legalistas e seus dogmas criados com intuído exclusivo de controlar pessoas que deveriam ser livres em Cristo, a outra é fruto de pouco aprofundamento na fé, nos fundamentos de doutrinas Bíblicas e no próprio relacionamento com Deus, como disse Jesus “a casa foi construída sobre a areia e não sobre a rocha” (Mateus 7:24 a 27), e a terceira esconde um problema sério que é uma industria formada por cristãos e imitadores de cristãos – que segundo Frank Schaeffer não podem na maioria das vezes ser distintos uns dos outros - formando e doutrinando cristãos modernos.

O cristão que conhece a Verdade não deveria temer apreciar algo só porque não foi desenvolvido nos guetos evangélicos, como reflete Frank Schaeffer em seu livro “
Viciados em Mediocridade
“os cristãos deveriam ser os que menos se sentem ameaçados por novas idéias artísticas, pela experimentação, por correr riscos, de olhar e apreciar o que o outro lado tem a dizer. Se os nossos pés estão solidamente enraizados na verdade, podemos observar o mundo com confiança, prazer e realização.”

Na verdade o cristão deve ter cuidado com o que é produzido nos guetos evangélicos, que muitas vezes vem carregados de heresias disfarçadas e facilmente confundidas com espiritualidade, por abaixar a guarda - já que se trata de material confeccionado por nossos “irmãos” - ficamos expostos a muita coisa que vai contra o ensino das Escrituras, e poucos tem sido como os bereanos, que como nos tempos do apostolo Paulo iam verificar “se as coisas eram mesmo assim”(Atos 17:11).

A falta de esforço e dedicação também podem vir disfarçados de espiritualidade quando cristãos querem lançar sobre a oração a responsabilidade de seu desenvolvimento artístico.

Para alguns a oração deixou de ser um relacionamento com Deus e passou a ser um amuleto ou uma abstração da realidade.

Para muitos cristãos dizer “estou orando” significa dizer “não quero fazer a parte que me cabe nisto” emendando logo algum jargão do tipo “tudo posso naquele que me fortalece” e segue trabalhando obras medíocres que só são aceitas mediante o marketing da industria gospel, caso tenha esse fator ao seu lado.

Orar em todo tempo significa ter relacionamento com Deus e esse relacionamento logo ensina que Ele se agrada do trabalho e da dedicação como podemos ver no principio da criação:

“E tomou o SENHOR Deus o homem, e o pôs no jardim do Éden para o lavrar e o guardar.”( Genesis 2:15) “Havendo, pois, o SENHOR Deus formado da terra todo o animal do campo, e toda a ave dos céus, os trouxe a Adão, para este ver como lhes chamaria; e tudo o que Adão chamou a toda a alma vivente, isso foi o seu nome.”(Genesis 2:19)

A preguiça e a falta de interesse genuínos pelas artes trabalham contra o artista cristão, não há desenvolvimento sem suor, como disse Picasso “arte é 20% inspiração e 80% transpiração”, se queremos ter relevância nos meios da cultura e das artes vamos precisar fazer mais do que usar jargões desgastados e fingir espiritualidade.

fabio q

Nenhum comentário: